Resumo
de texto
SANTOMAURO, Beatriz. Ameaça de retrocesso paralisa a inclusão.
Revista Nova Escola, São Paulo: Editora Abril, Abril, 2012. n.251, p.28-29.
A inclusão de crianças
e jovens com necessidades educacionais especiais (NEE) na Educação Básica tem
gerado muito debate no país. Existem os que consideram mais adequado os
estudantes com deficiência frequentarem apenas escolas especiais enquanto as
instituições regulares não estiverem preparadas para atender às suas
particularidades. E também há defensores das classes regulares como o melhor
local para que eles aprendam os conteúdos curriculares e convivam com os demais
alunos. As políticas brasileiras vêm apostando na segunda opção, e a
experiência da última década aponta que a inclusão ocorre de fato quando todos
frequentam as mesmas salas de aula. Obviamente, para que essa prática se
traduza em ganhos efetivos, são necessários investimentos substanciais em
infraestrutura e na contratação e na formação de profissionais, lacunas ainda não
totalmente preenchidas.
Segundo o Ministério da
Educação (MEC), há 200 mil crianças e adolescentes com NEE fora das salas de
aulas. A situação está longe da ideal, mas admite-se que o processo ainda está
em curso.
Em novembro de 2011, no
entanto, o governo federal apresentou orientações que podem promover um
retrocesso na área. Na data, a presidente Dilma Rousseff promulgou o decreto nº
7611, que estabelece regras bastante ambíguas. O texto indica a continuidade da
política inclusiva ao determinar, por exemplo, a oferta de educação especial
“preferencialmente” na rede de ensino regular e a garantia de um sistema
inclusivo em todos os níveis para quem tem alguma deficiência, transtornos
globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação. Em outro
trecho, porém, aceita a matrícula em instituições especializadas ou classes
especiais como uma opção. As mudanças são sutis, mas permitem, por exemplo, que
o estudante com NEE volte a ocupar um ambiente segregado e que não favoreça o
seu aprendizado e a sua participação mais efetiva na sociedade.
Na mesma linha do
decreto presidencial, está a emenda do Plano Nacional de Educação (PNE) –
atualmente em discussão no Congresso Nacional. O texto também admite que
estudantes com deficiência sejam atendidos em escolas especiais, caso não seja
possível integrá-los em classes comuns. Cabe registrar que as instituições
especializadas no atendimento às pessoas com deficiência têm qualidades e
importância reconhecidas na vida desses alunos, tanto que oferecem atendimento
especializado no contraturno. Via de regra, no entanto, elas não possuem a
estrutura adequada para ensinar os conteúdos curriculares.
A escalada positiva
para a inclusão (que agora corre o risco de ser interrompida) começou na década
de 1990. Antes disso, crianças e jovens com NEE eram tratados como doentes que
precisavam de atendimento médico e de assistencialismo, e não de educação. A
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de 1996, estabeleceu que
a matrícula deles deveria ser feita, preferencialmente, na escola regular.
Mesmo assim, ainda havia a possibilidade de existirem classes especiais dentro
ou fora das instituições de ensino. Ano a ano, novas diretrizes foram traçadas
para fortalecer a inclusão, e o número de matrículas dos estudantes com NEE em
salas regulares superou as outras instituições.
Em 2008, houve outra
mudança importante. A Política Nacional da Educação Especial na Perspectiva da
Educação Inclusiva tornou o ensino regular obrigatório e o decreto nº 6571
definiu a educação especial como uma atividade complementar. Ou seja, aqueles
com NEE deveriam frequentar a escola juntamente com os demais e poderiam ter
acesso a outros serviços nas instituições especializadas, em horários
alternativos às aulas. Três anos marcados por muitos avanços sucederam essa
determinação. Nunca se estudou tanto a inclusão na sala de aula e se obtiveram
tantas conquistas como nesse período. Por isso, assim que a mais recente
determinação presidencial veio à tona, pais de alunos, políticos, profissionais
e pesquisadores desse tema foram a público se manifestar contra ela. Se o
acesso à educação de qualidade deve ser garantido a todos, porque ele é
oferecido apenas a parte das crianças? Se a escola deve refletir a diversidade
da sociedade, porque seria mais adequado que estudantes com NEE ficassem
separados em instituições especiais?
O MEC considera não ter
havido mudanças significativas e a Diretoria de Políticas de Educação Especial
(DPEE) divulgou uma nota técnica reforçando os aspectos positivos do Decreto.
Mas não há dúvida de que o texto abre caminho para um recuo nas políticas de
inclusão. É grande o risco de cessarem as medidas afirmativas necessárias para
sua evolução. Contudo, em suas sutilezas, de fato ele deixa aberta a
possibilidade de as conquistas serem mantidas. O esforço, agora, continua nas
mãos dos pais e responsáveis, que decidem onde matricular esses alunos. Cabe a
eles batalhar para que o caminho trilhado nos últimos anos siga vencendo a
exclusão. E assim o acesso à educação será garantido e todos terão mais chances
de ter suas individualidades respeitadas.
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